Eu realmente acredito que uma das coisas mais importantes na vida é focar em nos sentirmos bem. Ao mesmo tempo, também acredito que precisamos sentir mais do que for que estejamos sentindo.
Acontece que, ao meu ver, estas duas coisas – tantas vezes paradoxais – precisam ser olhadas com cuidado, porque o assunto é complexo. E muitas vezes é abordado de forma simples mundo afora.
Como codependente eu me treinei a vida toda para não sentir. Pra me controlar, parecer ser forte, alegre, confiante, estar sempre bem, e me treinei pra não chorar e demonstrar minha vulnerabilidade. Foi um treino exaustivo e que por conta disso hoje me pede que eu tenha muita atenção em me destreinar.
Nós mulheres em recuperação da codependência, fortonas-tá-tudo-bem-cmg-não-preciso-de-ninguém, que achávamos que era bom dar conta de tudo sozinhas, precisamos treinar o nosso sentir, assim como nós que “sentimos demais”. E vou explicar um pouco sobre estes dois casos.
Sentir é viver. Nós precisamos sentir. Faz parte do que somos como humanos. Eu amo muito o fato que eu posso sentir agora.
Isso “de sentir” é uma confusão danada e dá trabalho. Mas para mim: é só isso que vale a pena. Sentir é a alegria do meu viver mesmo quando estou sentindo coisas desconfortáveis que na hora são uma grande M. Mas agora, finalmente, estou viva e sei que estou, porque sinto.
Durante muito tempo achei que se só me sentisse bem teria uma vida maravilhosa. E eu por conta disso conquistei muitas coisas boas… na minha carreira.
Viver conectando tão pouco com o que se sente nos deixa sem informação sobre que relações nutrir, que limites estabelecer, que vontades seguir. As coisas acabam vindo muito da cabeça e muito pouco do coração. Logo, pras coisas da cabeça ficamos ótimas, mas pras do coração… como percebemos, nem tanto.
Quando eu cheguei no ápice do que considerava: bem sucedida, me vi sozinha. Porque, sim, tinha muita gente ao meu lado me apoiando. Mas de verdade, eu não sentia que tinha alguém pra comemorar comigo.
Eu me sentia isolada porque eu não me compartilhava de verdade. Ninguém sabia o tava acontecendo dentro de mim e na grande maioria das vezes nem eu mesma. A solidão era por estar sozinha de mim, principalmente.
PORÉM… TODA VIA, ENTRETANTO, PRECISAMOS TER CUIDADO COM O OPOSTO:
Só ficarmos presas no nosso sentir, numa auto-referência auto-centrada – muitas vezes ainda muito infantil. E uma grande pegadinha para quem é altamente sensível também.
“A minha dor. O meu sentir.”. Podemos ficar muito tempo lambendo feridas…
Quando estamos mais no modo da “carente” ou “eu sinto demais”. Também precisamos treinar o nosso sentir, de uma forma madura. Muitas vezes esse “sentir demais” é uma forma de nos proteger e nos distrair de realmente apenas sentir e entrar em contato com o que acontece dentro.
Muitas vezes o que parece “sentir demais” é o sentimento de desespero e desamparo. Desespero de estar sentindo algo e resistindo.
Precisamos treinar sentir e aprender a nos amparar. Saber que nós podemos nos cuidar e ficar com nós mesmas quando os sentimentos, emoções e sensações vem. E não entenda isso como: “não ser bom compartilhar o que você sente”. Poder compartilhar o que sentimos é muito bom e muito importante pro nosso processo e pra vida!
Mas já parou pra pensar que muitas vezes passamos uma vida desejando que alguém nos salve (e salvar é sempre uma palavra chave pra codependência) de tudo que se passa dentro, sem nem perceber que é isso que estamos buscando? E sem perceber que “sentindo demais”, muitas vezes, estamos fugindo do nosso sentir… às vezes usando os problemas dos outros porque nos permite nos distrair, às vezes usando o nosso trabalho excessivo, vícios, dramas pra isso também.
AGORA NESTE PROCESSO TODO E COMPLEXO DE APRENDER A SENTIR IR DE UM OPOSTO PARA O OUTRO FAZ PARTE:
Do não sentir nada pro drama. Muitas vezes é assim que muitos processos acontecem. Comigo certamente foi assim. E foi muito válido. Hoje vejo que o importante é ter consciência que isso faz parte, e então não nos demorarmos muito mais do que necessário, nem no não sentir nem no sentir da auto-referência, auto-centrada.
A questão é complexa, né?
Não somos robôs e não aprendemos a sentir linearmente e perfeitamente. O que acredito que podemos fazer é aprender a lidar com o que sentimos de uma forma mais madura e adulta. Desenvolver mais recursos, ferramentas, conhecimento e prática. Aprender a lidar com o que foi sentido lá trás e como cuidamos de nós e do que sentimos. E saber que é muito importante buscarmos ajuda quando necessário.
E isso demanda um processo de aprendizagem como pra qualquer outra coisa. Ou seja, toma tempo, é preciso investir nisso, cair, levantar, tentar de novo, ter compaixão com a gente, e seguir crescendo e melhorando.
Então, quem sabe, antes da gente se apressar em se sentir bem, podemos (sem tentar fazer isso perfeitamente, porque ninguém consegue):
- Primeiro: ACEITAR. Sentir o que precisa ser sentido, sentir no corpo. Sem a história do porquê estamos sentindo. Sem pensar, sem tentar controlar ou racionalizar. Isso é muito importante pra nós – na verdade, para todo mundo.
Nos dar este espaço de sentir de uma maneira mais crua porém com a consciência de não precisar reagir. Isso é um treino: Aprender que podemos sentir o que for sem precisar tomar uma decisão ou ação. E “apenas” validar e tentar, minimamente, acolher o que sente. - Depois de nos aproximar da emoção ou sentimento, podemos então olhar com carinho para ele, com mais distância para amadurecer e entender o que quer nos dizer e o que está nos informando. Porque certamente está:
1) Sabe aquela sensação de “Por que eu costumo sentir tanto disso?” ou “Porque isso se repete tanto comigo”? Elas podem nos mostrar se estamos projetando algo do nosso passado no presente. As vezes tem alguma coisa ali que ainda nos prende, uma ferida não olhada ou uma forma antiga de ver as coisas. Será que posso/preciso amadurecer aqui? O que preciso processar para poder viver, e ver, esta situação com olhos do presente?
2) Podemos nos perguntar também: Será que estou “sentindo” estes sentimentos ou resistindo? A dor maior vem sempre do tanto que resistimos sentir – sem resistir, as emoções passam com mais “facilidade”.E eu odeio e amo ao mesmo tempo ter que dizer que: Amadurecer envolve lidar com desconforto e não sair correndo ou jogar a responsa para outras pessoas.
Em grande parte, não é só sobre o que sentimos e pensamos, afinal vamos sentir de tudo e vamos ter tantos pensamentos inconscientes. É muito, ou tão mais, sobre a nossa relação com o que sentimos e pensamos. Sobre como vamos lidar com nós mesmas enquanto sentimos e sobre como escolheremos lidar com aquilo que sentimos, criando mais resistências ou não.
3) O que sentimos é um grande GPS, quando estamos no presente, sem projetar tanto do que foi lá atrás, isso pode nos informar de um limite que precisa ser colocado, uma decisão que precisa ser tomada, uma necessidade que precisamos buscar atender, uma correção que precisamos fazer com nós ou outros, etc.
Amadurecer pede que a gente desenvolva novas maneiras de ver e lidar com a vida. E essa nova maneira de ver a vida a gente não adota simplesmente no fast-food-terapia pelo instragram de alguém, isso vem de um processo e desejo profundo de crescer, amadurecer e querer mudar. E envolve botar a mão na massa, sentar e ficar com o que incomoda.
DO QUE EU SEI ATÉ HOJE, QUANDO O ASSUNTO É SENTIR BONS REMÉDIOS SÃO:
Tirar o auto-julgamento, o certo ou errado, estar consciente do que se sente e ter muita auto-compaixão por nós sem precisarmos ficar na autopiedade.
E como sabemos: Ninguém aqui é perfeito. Muitas vezes se jogar na autopiedade também vai acontecer. Quando eu me vejo fazendo isso – e hoje o legal é estar consciente que estou fazendo isso – me dou uns momentos para me vitimizar e ser imatura – que cada vez duram menos – e aí me digo: “Okay, Ariana, agora que você já se vitimizou vamos ao que interessa: O que vamos fazer com tudo isso”.
Aí sei que posso olhar mais com a confiança da adulta que sou – e estou batalhando pra ser – e posso olhar de frente para a realidade do que está rolando dentro de mim e para o que está acontecendo fora.
Realidade. Do que sinto dentro. Realidade do que acontece fora. Realidade, sempre a realidade.
E isso tudo não é nem um pouco fácil quando passamos os anos nos julgando, controlando, analisando cada emoção, nos punindo, massacrando nossas emoções ou nos distraindo do que sentíamos.
Mas é super possível para – grande maioria – de nós.
Vamos deixar o que sentimos tomar ar, ventilar, existir e nos darmos tempo e as ferramentas que precisamos.
Sabendo que somos seres humanos complexos e mais que focar só em só sentir bem – que é muito válido – podemos focar em sentir melhor e amadurecer.
Já estamos neste processo.
E como sempre, lembremos: Podemos fazer coisas difíceis.
Cuide de você!